quarta-feira, 27 de agosto de 2008

O primeiro chefe — ou ao mestre com carinho

Este texto de hoje estava em minha cabeça desde setembro. A demora em escrevê-lo se deveu, inicialmente, à dificuldade em lidar com o fato triste que o inspirava. Mas, passado o período de recolhimento, vejo que há um clima propício para trazer o assunto à tona porque ele dialoga bem com as reflexões que venho desenvolvendo neste espaço.

Sempre comento com as pessoas que me cercam que concordo com aquela antiga proposição de que existem estréias na vida que você nunca esquece: o primeiro beijo, o primeiro tombo, o primeiro amor, a primeira grande perda, o primeiro filho, etc, etc. Pois o primeiro chefe também é uma destas "estréias" inesquecíveis, porque ele marca nosso rito de passagem para a vida profissional e pode marcar positivamente ou negativamente.

No meu caso, tive a sorte de ter tido como primeiro chefe um líder inspirador, que apostou em mim, que soube me mostrar claramente os caminhos, mas, principalmente, deu espaço para que eu criasse o meu próprio estilo de trabalhar. Imagino que deve ter sido uma tarefa difícil para ele, pois sempre fui uma pessoa com idéias próprias, que faz tudo com intensidade e paixão, defendendo meus pontos de vista até o fim, o que nem sempre é fácil de administrar.

Em outras palavras, tenho uma alma livre, e se meu primeiro chefe tivesse tentado me aprisionar, talvez eu não tivesse alcançado o grau de realização que tenho hoje. Mas bem no início da minha carreira, naquele período em que a gente aprende mais errando do que acertando, este chefe teve a sensibilidade e a generosidade de perceber que tudo o que eu fazia tinha o sentido de buscar o melhor resultado, ainda que eventualmente eu "metesse os pés pelas mãos", como é comum quando se é jovem. O fato é que meu primeiro chefe soube amparar meu crescimento, dando-me a liberdade na medida certa. Ou seja, sem me puxar para baixo, vetando minhas idéias audaciosas e, ao mesmo tempo, sem me deixar "livre para fazer o que bem entendesse" (o que, muitas vezes, é uma maneira indireta de demonstrar indiferença).


O que ele fez, de uma forma que poucos saberiam fazer, foi exercer seu papel de líder, sem ser seduzido pela tirania que o poder muitas vezes representa. Hoje, que ocupo e exerço a função de chefe, procuro, mesmo depois de tantos anos, me mirar no exemplo dele, dando às pessoas que trabalham comigo a liberdade para serem fiéis aos seus modos de ser, mas sempre deixando claro que estarei por perto caso precisem de mim.

O desafio que foi dele e hoje é meu, de liderar com generosidade e equilíbrio, se estende a qualquer um que ocupe a posição de líder. E ele soube como ninguém superar este desafio. Faço deste artigo uma homenagem a Ricardo de Almeida Prado Xavier, que foi meu primeiro chefe e faleceu no último 19 de setembro, sem que eu pudesse lhe dar um último abraço afetuoso e dizer mais uma vez: "Muito Obrigada!".


*Psicóloga, professora de MBA da FIA, consultora de Recursos Humanos, presidente do Grupo DMRH e Cia. de Talentos. Autora do livro "Virando Gente Grande – Como Orientar Jovens em Início de Carreira". E-mail: sesteves@uol.com.br

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